Governo Federal considera mineração atividade essencial e torna-se cúmplice de mineradoras
- gabinetedecrisecom
- 8 de abr. de 2020
- 3 min de leitura
Nem mesmo a escalada de casos do novo coronavírus impediu setor minerário de se mover

Em meio à escalada de casos do coronavírus no Brasil, que até a noite de hoje (8), registra 15.927 casos confirmados e 800 mortes, o Governo Federal publicou uma portaria considerando a mineração como atividade essencial. Publicada na noite do sábado, 28 de março, a portaria dá aval para que as mineradoras exponham seus funcionários ao risco de contaminação ao considerar que a atividade não pode ser paralisada durante a pandemia. A portaria foi assinada por Bento Albuquerque, ministro de Minas e Energia. O decreto coloca como essencial não só o processamento e a logística em si, mas também a pesquisa de recursos minerais. Antes, o Observatório da Mineração publicou duas matérias que denunciavam que a Vale mantinha trabalhadores aglomerados no Pará e em Minas Gerais e que a CSN Mineração fazia o mesmo – trata-se das duas maiores produtoras de minério de ferro do país. Depois da publicação das reportagens, a Articulação Internacional dos Atingidos pela Vale protocolou uma denúncia no Ministério Público do Trabalho, que abriu um inquérito civil para investigar o caso.
Com o decreto, as mineradoras poderão manter centenas de milhares de trabalhadores aglomerados e expostos ao risco da Covid-19 e seguir até com as pesquisas em todo o país, incluindo aquelas que incidem sobre terras indígenas na Amazônia, como mostrado numa série de reportagens do Observatório.
O Observatório da Mineração perguntou ao MME se o ministério foi procurado pelo Ibram (Instituto Brasileiro de Mineração) e por mineradoras para inserir a mineração como atividade essencial no meio de uma pandemia e assinar a portaria no sábado à noite.
O ministério confirmou que sim, foi “procurado por empresas do setor e suas associações representativas solicitando a inclusão da mineração como atividade essencial, após a edição do Decreto 10.282/20”, afirmou. Perguntado sobre o mesmo tema, o Ibram também confirmou que “mantém um contato constante com o MME”.
O Ibram ainda disse que “os minérios são matérias-primas para quase todas as indústrias e para o agronegócio. Sem o suprimento de minérios, muitos setores podem correr o risco de desabastecimento, talvez chegando até ao consumidor brasileiro”.
Exceção como prática
Na resposta à reportagem do Observatório da Mineração, o MME ecoou o mesmo discurso do IBRAM e citou a Constituição (artigo 176), a Lei 3.365 de 1941 e o Código de Mineração de 2018 para afirmar que a mineração é imprescindível ao país e que, em resumo, “a produção de alimentos, remédios, embalagens, peças e equipamentos se faz impossível sem os bens minerais”.
Ainda segundo o MME, a Portaria 135/20 tem o objetivo de assegurar o abastecimento de insumos indispensáveis à sobrevivência, à saúde e à segurança da população enquanto perdurar a pandemia da COVID-19.
Para Bruno Milanez, doutor em política ambiental e professor da Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF), o MME tomou a exceção como regra. O pesquisador lembra que a mineração, de forma geral, é uma atividade de grandes escalas, com grandes estoques, uma cadeia longa de extração, processamento, logística e transformação que leva meses até o produto final.
Por causa da pandemia, a demanda está diminuindo. Parar agora, portanto, quando a contaminação está crescendo rápido no Brasil, apenas reduziria os estoques existentes, não comprometeria a produção de remédios, alimentos e equipamentos e preservaria a saúde dos trabalhadores.
“Seria possível deixar pelo menos 70% dos trabalhadores em casa sem problema algum de desabastecimento. Precisaria ter inteligência, esforço e vontade de fazer o que é correto. Mas não parece ser a posição do MME, que é a de manter tudo funcionando como se todo o minério extraído fosse ser usado pelo Brasil nesse momento, o que é uma falácia”, afirma Milanez.
Leia a reportagem completa do Observatório da Mineração.
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